APOCALIPSE
Peter
A nossa luta contra o fogo tornou-se crónica e épica. Na falta de castelhanos, os únicos afinal com quem mantivemos guerras acesas na Europa envelhecida, recorremos finalmente ao fogo posto para manter ocupada a nossa inteligência incendiária, especialistas, estrategas, investigadores, magos, jornalistas, comentadores uma plêiade de portugueses “experts” bem nascidos, bem falantes, bem sustentados nos contornos duma esfera armilar para nos comer a carne e nos deixar os ossos consumidos por lobies. O previsível voltou a acontecer perante o caos dos defensores e da fragilidade dum governo ainda a beneficiar das boas graças do tempo e da hetacombe eleitoral da oposição mas que voltou a não estar á altura do desafio dos fogos. Faz a mesma triste figura dos governos terceiro mundistas que se sucedem uns aos outros e não se preocupam com esta guerra que leva riqueza e vidas. Levam décadas de estudos, dúzias de doutoramentos, toneladas de ideias, montes de dinheiro e, pese a genialidade das armas e dos barões assinalados , feitas as contas são incapazes de dominar o inimigo. Erram os cálculos vectoriais da mesma maneira que as fáceis contas aritméticas e acabaram por fazer apocalipses como ninguém colocando-os no terreno como uma mortífera bomba de partículas atómicas. Perante inocentes portugueses, as cobaias estivais, inventaram acendalhas e produziram infernos onde hoje a pobreza e a humildade dum povo perece em fornalhas apocalípticas como se fossem cristão-novos ou criminosos comuns. Abandonados á sua sorte por governos legitimados pela ganância irresponsável de partidos e de jobs que perderam a noção de quem é esta gente que dá pelo nome de portugueses para se concentrarem nos banqueiros e nos correligionários , os políticos deixaram á solta a corrupção , a defesa e a miséria das pessoas , esta última como se pode ver com o espanto das imagens televisivas que nos entram casa dentro. Esta ineficácia de aprendizes que após a bancarrota leva vidas, casas, animais e bens á frente das labaredas e deixa pregados no chão mais de uma centena de corpos de humanos compatriotas indefesos e sem ajuda como se fossem galinhas depenadas, não é própria nem digna duma democracia, mesmo que a democracia não passe do tubo de ensaio ou experiencia que ainda não conseguiu expurgar os vícios com que nasceu, a incompetência, a mediocridade ou os compadres. Queimados numa fogueira inquisitória e laica ou numa moderna guerra química e termodinâmica estas vitimas inocentes tem culpados na partidarite dum regime que plasmou na guerrilha dos interesses pessoais , duma classe sem condições e princípios para governar um país, que faz da impotência e do amadorismo baronil dos seus agentes e amigos a pedra de toque da governação. Quanto ao tratamento florestal do território, como se vê ,é pura e simplesmente o abandono a um caos sem rei nem sem roque que inclui as pessoas e os bens. Politicas de influência quemtêm calcado aos pés o interesse da economia nacional e do cidadão e os resultados são os que estão á vista, um falhanço total que dificilmente poderia ser pior, um cenário onde os governantes imolaram, por incumprimento dos seus deveres mais básicos, mais de uma centena de portugueses em sucessivas piras de sofrimento e morte sem terem sequer consciência da gravidade do fenómeno no posterior da desgraça.
Não são três ou quatro dias de luto com as lérias habituais nem um abraço á família em dor ou mesmo férias estragadas duma senhora ministra juntas ao peso da consciência existente no poder que apagam os erros cometidos , a asneira persistente , o trabalho não feito que culminou na catástrofe. Não são as visitas do Presidente da Republica que ressuscitam os mortos ou reconstroem os bens , as famílias, os empregos, tudo o que se perdeu com as leviandades de quem manda.
Faltam sim os actos , as estratégias e um objectivo definido claramente no tempo a favor do cidadão e do interesse nacional. Falta o fim das empresas comprometidas e levantadas á pressa para o negócio do fogo , falta transparência absoluta na gestão corrente da coisa publica e um equilíbrio da economia e da cultura no sentido dum cidadão consciente com dignidade de vida e respeitado como tal. Cem mortes de inocentes por desprezo e por incúria não são o brincar que pretendem fazer ser!
Falta fazer um país honesto e sério e acabar com esta brincadeira onde nos meteram escolas politico-partidárias que se apoderam demagogicamente dum poder medíocre, ignorante , num amadorismo pindérico de país do terceiro mundo onde tudo é permitido perante a impunidade de quem é responsável. Não chega o voto para branquear as mortes!
Reordenar o território não é tarefa difícil, o que falta é vontade , como em outras áreas, de trabalhar com seriedade sobre a realidade dum povo e não sob a égide de compadres, de afilhados e amigos e não fazer da nomeação partidária um negócio de selecção de interesses. Aqui, o regime apodreceu e apodrece-nos.
Dois meses depois da vergonhosa tragédia de Pedrogão Grande coube a bombástica experiência á zona centro de Portugal. Uma região que tem empobrecido pela desertificação constante, pela ausência de estímulos económicos e esquecimento por parte dos poderes públicos , pela falta de investimentos com estratégia , quantificados e qualificados, pela divisão do poder em capelinhas sem escala e sem dimensão.
Numa das últimas crónicas evidenciei algo semelhante em relação á Mata Nacional do Buçaco. Quis o acaso, simplesmente o acaso, que não ardesse, no entanto aconteceu muito pior, arderam pessoas. À Mata , que segue o caminho partidário da ineficácia e do jobismo, há-de chegar destino igual , mas aí, do mal o menos, só arde vegetação.
Outubro,16,2017 Buçaco.blogs.sapo.pt