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______BUÇACO______

TEXTOS ,SUBSÍDIOS, APOIO

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15
Jan10

BATALHA BUSSACO-3ª INV-FESTA ALMAS-1


Peter

 

A FESTA DAS ALMAS

 

 Passam em Setembro duzentos anos sobre a batalha do Buçaco tradicionalmente comemorada a 27 com o nome local de Festa das Almas. Eu digo Festa das Almas porque era assim chamada desde a minha meninice e acrescento festa do povo, porque se das guerras que se travaram em Portugal se pode retirar rudeza e sacrifício para a gente que as viveu, a das invasões francesas foi a que mais pesou, a mais cruel e sofrida, a que mais sacrifício exigiu ás populações nos palcos onde decorreu mas também, mercê de inúmeras consequências, ao país inteiro quando o cidadão, já escravizado e vitima do sofrimento infligido pelo exército invasor, teve de suportar nos anos seguintes o peso de amigos ingleses chefiados por Beresford , um tiranete apostado em deixar apenas o esqueleto da débil nação que se tinham proposto ajudar. Para não falar da pitoresca monarquia, a banhos no Brasil!!!!!

Talvez esse seja o principal motivo porque a festa, rija e comemorada, perdurou na memória colectiva com grande força até aos dias de hoje e seja participada e sentida em directo pelas recordações geracionais chegadas ao presente pela tradição familiar, tradição que se mantém viva em muitos corações, sobretudo de quem descende dessas memórias orais dos baús das invasões desde Junot a Massena.

Era pois Festa das Almas que se chamava e chama á romaria que leva ao largo do Obelisco milhares de pessoas, observadores atentos das manobras militares que cada vez são mais reduzidas, mas que eram de certa grandiosidade á relativamente pouco tempo e plenas de solenidades e exaltação patriótica.

Ao tempo da batalha existia adiante da Porta da Rainha a capela do Encarnadouro, modesto edifício mandado construir por Luís Rodrigues de Santa Cristina da Serra e é provável, segundo se pode depreender de alguns relatos, que lhe estivessem associadas duas ou três casas formando um pequeno lugar. Ora esta capela serviu na altura de hospital de campanha ou hospital de sangue e foi ali que se prestaram os primeiros socorros aos feridos da contenda com a singularidade dos relatos apontarem o facto de terem sido assistidos muitos franceses. Das Almas do Encarnadouro derivou pois o nome, festa mais justificada ainda pelo facto de ali ter sido para muitos, um purgatório de almas em transição final.

São duzentos os anos passados, mas dando-me ao pequeno exercício de fazer contas muito simples chego á hipótese de supor que o meu trisavô paterno, tendeiro ou almocreve na Mealhada, tenha assistido á batalha ou tenha presenciado alguns dos episódios desses dias terríveis durante as suas andanças pela serra e pelas redondezas, associando medo á curiosidade ou curiosidade ao seu trabalho de caminhante perpetuo pela via profissional. Não deixa de ser uma hipótese bem provável se alicerçada no calculo das probabilidades, que coloca bem perto a realidade. Realidade longínqua pela contabilidade humana, há um instante no contexto universal.

Desta participação colectiva vem o cordão umbilical que suporta a curiosidade absorvente sobre o fenómeno em cada ano de lembrança, quer do lado litoral, quer das minhas costelas serranas dos vizinhos municípios de Penacova ou Mortágua, palcos privilegiados dos acontecimentos. De resto a batalha, em relação á divisão administrativa, é um todo indistinto que engloba os confinantes com a serra do Buçaco e não só.

     Meu pai tinha o mesmo pensamento, pois a festa para ele era um evento mais ou menos sagrado e sempre que por ali passávamos nas vésperas natalícias a caminho da sua aldeia natal, fazia questão de sublinhar a importância da capela da Senhora da Vitória como hospital de sangue e foi  assim que desde tenra idade fiquei ligado á batalha , pois o nosso caminho seguia acima de Sula, Moura, do Cerquedo e Santo António do Cântaro, cenários centrais do desenrolar dos conflitos, locais  que vim a conhecer como as mãos, quer ao nível dos cumes, das encostas , dos sopés, das escarpas ou das ribeiras que escorrem daqui e dali para o Mondego ou para o Vouga.

No dia da festa, no fim do verão portanto, subíamos do Luso ao lado do cinema, ao campo da bola, á costa do sol, cruzávamos as portas da rainha e continuávamos rente ao muro da cerca até ao cômoro acima da esplanada onde decorriam os festejos. Ali nos sentávamos com a cesta do farnel olhando o obelisco e vendo a colorida cerimónia donde sobressaía o patriótico e enaltecido discurso dum adido militar e o desfile militar das tropas anglo-lusas, os lusos de sorrobeco cinzento de pardo luzimento e qualidade, os anglo em coloridas e garbosas fardas vermelhas debruadas a branco e azul, na pompa e orgulho de representantes de sua majestade. E a charanga, debitando marchas militares adequadas acompanhava com música.

Não percebia porque é que as tropas eram sempre anglo-lusas, nunca luso-anglas como me parecia presumir pela gramática, estávamos na Lusitânia, não na anglotânia , o herói Viriato tinha expulso os romanos , era o maior de todos, o Condestável, beato e santo, o Rei de Castela e fazia-me assim confusão o primeiro lugar dos anglos ante o próprio prejuízo. Só mais tarde vim a compreender que prevalecia a lei do mais forte, nos países como nas famílias, como nos homens, como nos animais, como na vida. Daí a subserviência, pendurada na trave da fraqueza, ou na inferioridade das cócoras perante a sobranceria luxuosa dos bifeiros de além Mancha.

Só com o Benfica e depois o Porto, e isso foi muito mais tarde, é que a Lusitânia deu um ar da sua graça com golos que deixaram embasbacados os Tottenames e Liverpuis, mas isso, foi improviso aproveitado para negócios e grandezas que tão depressa nos exaltaram as gargantas como nos levaram ao esvaziamento dos cofres públicos em campos de futebóis e fúteis gargarejos de importância insustentada ou de miséria escondida. Tanto faz!!!

Seja como for, naqueles tempos havia sempre presente um pelotão de escoceses vestidos de saias de xadrez que depois desfilavam tocando bombos e gaitas de foles no terreiro do obelisco e davam um concerto nocturno , isto muito antes da existência da televisão e dos tatoos militares que foram moda posterior em muitos recintos desportivos. E também os passos lentos e cerimoniosos das fardas napoleónicas e lusas no recinto circular ou no regresso da charola á capela da Vitória faziam o encantamento geral, tal como o pesado bater dos cascos da cavalaria nas pedras do caminho metiam medo, não raro sob o rufo de charamelas e timbales manejados por cima do lombo das cavalgaduras pela teatralidade dos executantes.

 Á uma, duas da tarde, saia a procissão acompanhada pelo vistoso aparato militar enquanto troavam os velhos canhões de 1810 com tiros de pólvora seca a ribombar quilómetros em redor.

Finalmente nas Portas de Sula distribuía-se rancho a quem queria comer, macarrão, grão de bico e carne de porco, tudo entulhado como massa de reboco, mas nós, os das redondezas, de comum transportávamos farnéis em cestos de vime e sentávamo-nos pela mata a saborear as preciosidades caseiras, algum velho capão que fora quase família, assado no forno a lenha.

Só o por do sol abria as portas do regresso com um cartucho de nozes na mão e, ainda que ignorantes da completa dramaturgia acabada de ver, voltávamos satisfeitos com a parte que a cada um cabia, afinal a verdade do individuo no grande palco onde se ensaia a vida na sua imponderável globalidade. FS

Luso,Janeiro,2001(200anosdaBatalha))                                   Buçaco.blogs.sapo.pt

14
Jan10

GABY DESLYS


Peter

 

GABY DESLYS,

AMORES DE REI NO BUÇACO

 

  A vida de Gaby Deslys passaria ao nosso lado, não fosse o facto de ter estado no Bussaco, em Agosto de 1910, acompanhando e de algum modo confortando os dias conturbados e difíceis do jovem rei D. Manuel II, a dois meses da implantação da República, naquele que foi na altura, um criticado devaneio amoroso do nosso último rei. È isso que pretendemos desenvolver em linguagem simples, conhecer em mais pormenor esse escondido evento do nosso património histórico local, numa tentativa de o aclarar perante uma opinião pública que, regra geral, o desconhece.

  Sem pretensões da exactidão duma aturada busca histórica, mas respeitando a pouca biografia acessível que se refere ao assunto, vamos começar por situar a acção no Verão de 1910, Julho e Agosto, apenas porque foi esta estadia, entre outras que se atribuem ao monarca, a mais prolongada e significativa.

  O rei deslocou-se a 12 de Julho para o Buçaco a conselho médico, e aqui se manteve até 23 de Agosto desse ano de 1910. Quarenta e dois dias.

   Era presidente do Conselho de Ministros Teixeira de Sousa que enviou para sua protecção 40 polícias de segurança, agentes da judiciária, uma força de infantaria e um destacamento de cavalaria. A 14, dois dias depois da chegada, correu em Lisboa o boato da eminência duma revolução, ao qual se juntou a notícia dum golpe de mão sobre o monarca, no Buçaco. Todas as forças ficaram de prevenção, porém a rebelião, tratava-se do levantamento de Machado Santos e Cândido dos Reis, foi adiada.

  Nestes últimos meses a situação política agravara-se de tal ordem que o reino era uma ruína, a desorganização total, Lisboa estava a ferro e fogo e todos os dias se aguardava o desencadear da revolta que milagrosamente tirasse o reino do lodaçal de corrupção e incompetência em que se tinha metido e da bancarrota que se avizinhava a passos largos. Iam passados mais de dois anos sobre o regicídio e a morte de D. Carlos e do príncipe Luis Filipe e continuava-se a nada esperar do herdeiro D. Manuel, preparado para oficial de marinha e não para reinar.

 A situação era de tal modo grave que, quando se pensou em arranjar casamento para o monarca, não se encontraram princesas disponíveis na Europa para vir morar para Portugal, um país tido como atrasado, ignorante, perigoso, ainda que o rei, apesar da sua juventude, fosse considerado um monarca instruído, afável, simpático, de bonita figura, que falava fluentemente o português, o inglês, o francês e o alemão.

   Ora foi neste ambiente difícil, até trágico e incógnito que  o rei , ou porque aproveitasse a estada ou porque a tenha  propositadamente provocado, reclamou a companhia  de Gaby Deslys,  uma bailarina da noite parisiense que, como iremos ver a seu tempo, tinha conhecido numa das suas passagens pela cidade luz. Não encontramos referência á data da chegada da diva ao Buçaco mas tudo indica que a permanência foi longa e o idílio prolongado.

Logo que chamada, a artista não se fez rogada e deixando Paris no sud express

desembarcou, eventualmente na estação da Pampilhosa, não há notícia e juntando-se ao monarca que se encontrava no Palace Hotel , instalou-se no Chalet de Santa  Teresa, edifício ainda hoje existente e que substituiu . aquando da construção do hotel, a ermida de Santa Teresa que ocupava aquele local. Ali permaneceu gozando da paixão que facilmente se apoderou de ambos. O rei tinha então 20 anos, a Deslys 27, a juventude por força e simplicidade, ambos de trato fácil e gentil, ela feita e experimentada numa vida dura mas cheia de êxitos, tudo de feição a que o romance, e um rei, seja mesmo dum pequeno e intragável país como Portugal, é sempre um rei, se apertasse e fosse por diante. De resto D. Manuel, como já se disse, era uma figura simpática, atraente, como se pode ver pelas fotografias existentes, e facilmente agradou á diva francesa, numa relação aliás, que, mercê da popularidade de que gozava a actriz no mundo artístico da época depressa deu origem a variados comentários, entre os quais se regista o do New YorK Times Herald  que a apelidava de concubina régia.

  O hotel do Buçaco, mandado construir pelo pai sob a gestão do ministro Emídio Navarro, a maior figura que o Luso alguma vez teve, dava os primeiros passos, que também foram os primeiros passos dos grandes hotéis em Portugal.

 Jardins, floresta e tranquilidade forneceriam o cenário das mil e uma noites, adequados aos subtis encontros amorosos e o Buçaco, como o teria sido em Sintra, foi o paraíso da sua libertação, aqui, com a vantagem de aproveitar a distância na ausência da rainha mãe Amélia de Orleãs , da padreirice lisboeta que diariamente o atordoava com sermões e pecados , longe de ministros , secretários e das clientelas que se movimentavam pelos meandros do poder em inventonas e matreirices sempre prejudiciais aos negócios públicos.

O rei registou nas suas memórias estes momentos de felicidade, dos poucos que lhe reservou o seu breve reinado.

  Ora como nem tudo são rosas nesta vida, também ao monarca os prazeres ficavam caros e a época não lhos perdoou. A medida que se foi tomando consciência desta relação real , as criticas , então como agora, não se fizeram esperar , e a ligação passou a ser alvo do descontentamento geral , onde sobressaiam as vozes tonitruantes  do partido republicano, mas também de progressistas e regeneradores, reconhecendo unanimemente a inconsciência  a leviandade do monarca , contrapondo aos luxos  e exageros da corte o estado miserável do reino. Tinham razão , mas á inconsciência  juntavam  ainda  a tradicional liberalidade dos Braganças no que respeitava a  excessos herdados

do rei D. Carlos , exemplo que o filho, dizia-se, se prestava a seguir. Jornais como O Dia ou o Mundo  não regateavam nas criticas e nos insultos , num país de facto caótico , ás portas da falência social e politica onde grassava o crime, a fome, a doença, a incúria.

  Paixão, que não agradava também á rainha mãe D. Amélia, consciente e farta da libertinagem do Rei D. Carlos, seu defunto marido, e comentava:“Vim a saber pelas más-línguas que Manuel ainda tem uma paixoneta por essa divazinha do music-hall parisiense, Gaby Deslys, de origem marselhesa, cujo verdadeiro nome é Gabrielle Caire. Correm boatos segundo os quais Manuel segue as pisadas do pai e os seus esforços políticos serão imediatamente anulados por isso”.

  Das razões do reino, este lúcido comentário da rainha ilustra bem o descontentamento, mas sobretudo a falta de discrição no tratamento duma questão que, não fora a época conturbada em que aconteceu, talvez não tivesse ecos nem gerado tantas criticas e comentários como veio a acontecer.

  On-line em  BUÇACO,blogs, sapo.pt

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